Sexta-feira à noite.

Desapontar-se consigo mesmo é a pior das maldades que alguém pode fazer a si. E, no entanto, é inevitável. Gostaria de ser mais generoso com minhas fraquezas, mas elas levam de mim o que mais necessito. As chances escorrem-me por entre os dedos, mas o medo de fechá-los, muitas vezes, me faz soltar os braços, para ajudar a sorte a ir embora mais rápido. Dê-me a maior chance de todas, e eu não conseguirei aproveitá-la. Temo já tê-la recebido e, sem perceber, no reflexo de não olhar para o que jogo pela janela, deixei-a passar. Provavelmente sacrifiquei-a ao Deus que o Medo se tornou dentro do templo de que fiz  minha alma covarde. Rezo para ele, todos os dias, a oração final, a única coisa que me cabe, pois esta é a maior de todas as tristezas: pedir desculpas a mim mesmo, e não poder me perdoar.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015 às 21:00 , 0 Comments

Escárnio

Às vezes, me pego sendo cruel comigo mesmo. Outras, abraço-me com toda a fraternidade que consigo reunir. Não consegui balizar os momentos de rasgar a facadas os meus pontos fracos e os de costurá-los e remediá-los com mãos sensíveis, cheias de solidariedade. E nessa dança bizarra, me torno uma colcha de retalhos. Todos os dias tenho de me re-conhecer. Apresento-me e conforme a onda do dia, faço amizade ou torno-me inimigo mortal. Nesses arroubos, as vezes tomo decisões estranhas. Há pouco tempo, virei as costas para vários daqueles que eu achava serem meus amigos. Sinto que sobraram poucos. Talvez eu tenha tentado demais, exacerbado o vínculo tênue que havia entre nós, ou mesmo esperado demais. Porém, no fim, sinto que dei mais do que recebi. Será que é só impressão minha? Se analisarem de outro ponto de vista, não terei eu sido eu um amigo relapso também? Quem sabe... Pode ser o meu vício em solidão deixando a minha boca seca e eu, como bom viciado, bebo sem pensar duas vezes a chicotada do vazio. Será que eu, na verdade, não procuro me decepcionar? Sim. Dessa forma eu posso voltar aqui e escrever as mesmas linhas de novo e de novo. E lamentar. E esperar. Meu círculo vicioso é bem construído e me engana repetidas vezes. Se tudo o que eu mais quero é sair dele, por que ajo como se estivesse tão confortável? Quantas vezes terei de perguntar? Sabe o que eu acho? De verdade? Eu sou orgulhoso. A verdade é que eu me amo até demais. E a cada lacerada profunda do fio do meu próprio atame, a cada membro que eu arranco e prendo de novo no lugar, a cada faca nova que eu deixo me penetrar, eu me liberto de uma corda diferente. As minhas correntes são quebradas aos poucos, dura e dolorosamente, me fazendo ricochetear de volta pro mesmo fundo do poço. Eu gosto da dor. Gosto de me sentir fraco, pequeno. Mastigar as minhas entranhas faz os meus dentes sangrarem de dor, e eu gosto. Por enquanto, sou feito de ódio.Mas uma hora elas vão acabar, as correntes. E quando isso acontecer, muita gente vai sofrer os mesmos cortes, os mesmos vícios e a mesma sede imensa de viver que eu senti, pois eu não darei a mão a ninguém. Explodirei e sentirei cada pedaço do meu corpo doer como um grande grito preso ressoando numa sala imensa. Não acabarei rápido. Serei de asco e gastura para os lábios e ouvidos dos meus supostos amores. Abjeto, serei o lixo em que vivem os falsos e obsoletos amigos. Posso ser covarde, mas nunca deixei de cumprir a minha parte no acordo. Sempre souberam o que eu era e até onde eu podia ir. Não tiveram a mesma delicadeza comigo. Os meus demônios serão os maiores e engolirão a todos. Quero ver todos tão mal quanto eu. O meu julgamento será a minha ruína, pois eu sou o meu próprio juiz. Paguei propina a mim mesmo para me condenar. E, poxa vida, quanta pena eu sinto de mim...

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015 às 16:39 , 0 Comments