Há vezes em que penso em desistir. Principalmente quando olho para trás: revejo tudo aquilo que eu nunca quis ver, para começar. E sempre foi assim. Quando tento me lembrar, sempre me vêm a cabeça o que não devia. Absolutamente todas as minhas lembranças felizes são permeadas por alguma outra tão ruim quanto ou pior. E a maioria delas me mostram uma coisa: repressão. Acho que é por isso que os regimes totalitários me interessam tanto. O sofrimento daquelas pessoas que só morreram porque alguém pensou em um "certo" no qual elas não se encaixavam. Por que a gente sempre é mais massacrado nos momentos de mais fragilidade? Eu precisava de alguém. Nunca fui de muita inciativa. Penso que durante a nossa formação, nós vamos criando facetas e depois junta tudo e forma "eu". Eu não. Cada vez que eu tentava criar alguma nova, ela era empurrada pra dentro, socada, forçada a se esconder. Então eu criava uma máscara. Todas elas faziam o esperado. Sorriam quando tinham que sorrir, choravam quando tinham que chorar. Mas, nem todo o meu esforço foi capaz de me esconder. Todos perceberam o meu mal estar com a vida e comigo mesmo. A muito tempo já sabiam do meu estranhamento. Mas, eu era o estranho. Preferiram não me contar. Quiseram que eu mudasse. Tento entender, compreender que a posição deles não era a mais confortável de todas. Sei dos temores, os medos que o mundo nos inflige mas, por que não me ensinaram a ter coragem então? Por que foi que me ensinaram que era errado ser diferente? Por que eu não consegui abrir a porta dessa gaiola? Por que é que eu mesmo construí parede atrás de parede, para que não me vissem pelas barras? É fácil culpar os outros, eu sei. Mas é que, se eu culpar só a mim mesmo, ninguém fez diferença nenhuma em minha vida. Nem todos sabem, ou talvez só eles não saibam, ou talvez saibam e não querem saber, o quão mais temeroso é viver sozinho dentro de si. Queria ter coragem para ser como quero ser. Queria não me sentir desconfortável em cantar estando sozinho em casa. Queria superar os limites, quebrar as barreiras, nadar para fora do mar revolto. Penso ainda se isso é possível. Por mais que eu tente, acho que esse eu aqui já foi formado dessa maneira. Jamais conseguirei ser plenamente. Talvez, só talvez, eu queira o impossível. Mas, se eu perder o desejo de mudança, o que irá sobrar para mim? Ando sorrindo pela vida, mas é só porque cansei de chorar.
O que será que o Benveniste diria de um eu que se espelha em um tu para constituir-se enquanto o indivíduo que não é e nunca foi...?